Foto: Ricardo Stuckert / PR
Por Sofia Andrade
O comércio entre Brasil e China nunca foi apenas uma relação de compra e venda de commodities. É um jogo de poder, de reconfiguração global e de reposicionamento econômico que tem produzido não apenas superávits na balança comercial, mas empregos, investimentos e novas tensões geopolíticas.
Segundo levantamento do Conselho Empresarial Brasil-China (CEBC), em parceria com o Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC), entre 2008 e 2022 o comércio bilateral foi responsável por mais de 2,3 milhões de empregos formais no Brasil — número superior ao gerado por qualquer outro parceiro comercial. A força do vínculo sino-brasileiro não se mede apenas em cifras, mas na capacidade de irrigar a economia interna.
O salto de 2023 a 2025: ganhos e ajustes
A história, no entanto, não parou em 2022. Dados recentes da ApexBrasil mostram que, em 2023, a China respondeu por 30,7% das exportações brasileiras. Em 2024, essa fatia caiu para 28,6%, revelando um leve processo de diversificação, ainda que o país asiático siga como o maior destino dos produtos nacionais.
Em termos de investimento, a China manteve posição de destaque como um dos maiores investidores estrangeiros no Brasil até 2023, sobretudo em setores de energia e infraestrutura. A atualização do Perfil de Comércio e Investimentos China 2025 reforça que, apesar das oscilações, a presença chinesa permanece estruturante para a economia brasileira.
O fator Trump: taxações e oportunidades inesperadas
A reeleição de Donald Trump em 2024 e a implementação de novas tarifas sobre importações chinesas, especialmente em tecnologia e manufaturas, sacudiram o tabuleiro global. O que parecia uma barreira para Pequim abriu, paradoxalmente, uma janela para o Brasil.
Com as restrições impostas pelos EUA, a China intensificou sua busca por fornecedores alternativos em áreas estratégicas. O Brasil entrou nesse vácuo, fechando acordos para ampliar a exportação de soja, milho e carne bovina — produtos que tiveram valorização imediata no mercado chinês.
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Em 2024, as vendas de soja para a China cresceram cerca de 12%, segundo dados do MDIC.
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O setor de carnes também surfou a onda: frigoríficos brasileiros firmaram novos contratos de médio prazo, compensando em parte a queda de outros mercados.
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Além disso, houve avanços em negociações sobre tecnologia agrícola e energia limpa, áreas nas quais a China busca reduzir sua dependência dos EUA e onde o Brasil pode se projetar como parceiro estratégico.
Empregos e desafios
Esses movimentos repercutem no mercado de trabalho. A expansão de contratos agrícolas e de infraestrutura associados ao capital chinês mantém o Brasil como polo gerador de empregos formais vinculados ao comércio bilateral, embora em ritmo menos acelerado do que no auge de 2008-2022.
O desafio agora é evitar a dependência de ciclos de oportunidade externos — como as tarifas de Trump — e estruturar uma política de longo prazo que consolide a posição do Brasil não apenas como fornecedor de commodities, mas como parceiro tecnológico e logístico.
O fio condutor
A relação Brasil-China é, antes de tudo, um fio condutor da inserção do país no mundo. Enquanto Washington fecha portas e levanta muros tarifários, Brasília se vê diante da chance de consolidar pontes. Cabe ao Brasil decidir se continuará sendo o celeiro global a reboque de crises externas, ou se ousará usar esse momento para transformar o comércio em projeto de desenvolvimento.

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