Por José Nassif
O Brasil acorda como quem levanta de ressaca: olhos vermelhos, mas ainda insistindo que não bebeu nada. De um lado, a Paulista tomada de bandeiras norte-americanas — como se o velho Tio Sam tivesse virado patrono da Independência brasileira. De outro, o Supremo Tribunal Federal, togado e solene, encenando o papel de guardião da ordem.
É a batalha simbólica perfeita: rua versus toga. A avenida grita “anistia!”, a toga responde “prisão!”. No meio, a democracia dança desengonçada como adolescente em festa de 15 anos, sem saber se puxa o pai para o salão ou foge para o banheiro.
Alexandre de Moraes, juiz-carrasco para uns, guardião iluminista para outros, virou personagem de thriller latino: inspira amores fervorosos e ódios viscerais. Se fosse um personagem de García Márquez, estaria sentado numa cadeira dourada, escrevendo sentenças com pena de pavão. Para os bolsonaristas, é um Robespierre de toga; para os lulistas, um São Jorge com espada jurídica.
Enquanto isso, o Senado brinca de alquimia política: mistura perdão com punição, promete uma anistia light, sem calorias, que não engorda a impunidade mas também não emagrece as alianças. Alcolumbre, alquimista de discursos, promete a pedra filosofal: um texto que não agrada ninguém, mas mantém todos em suspense.
O União Progressista, união de pragmáticos, ensaia passos de valsa com o PL. Um namoro que se diz “estratégico”, mas tem cheiro de casamento arranjado para 2026. A direita reorganiza seu exército com a serenidade de quem sabe que, no Brasil, o eleitor tem memória de peixe — mas fome de espetáculo.
Lá fora, Putin e Xi sorriem para a câmera, Lula aperta mãos virtuais, e os BRICS posam de alternativa ao Ocidente decadente. A fotografia é grandiosa, mas o Brasil aparece na imagem como convidado que chega à festa com roupa amassada — preocupado com a briga de vizinhos que deixou em casa.
E nós? Nós seguimos no meio da avenida, tentando decifrar se a bandeira que tremula é brasileira ou importada, se o grito é por democracia ou vingança, se a toga é armadura ou máscara.
No fim, talvez sejamos isso: um país que faz de cada julgamento uma novela e de cada protesto um carnaval. Entre o aplauso e a vaia, a democracia sobrevive. Mas, convenhamos, sobrevive como quem tenta atravessar um campo minado de olhos vendados.

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