Foto: Lula Marques/Agência Brasil
Por Lara Monteiro
Na quarta-feira (24), a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado Federal deu um passo decisivo contra o cinismo político que vem sendo engendrado no Congresso Nacional há anos: rejeitou por unanimidade a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 3/2021, conhecida como a famosa “PEC da Blindagem”. A proposta havia sido aprovada pela Câmara dos Deputados com 353 votos favoráveis e pretendia conceder aos parlamentares o poder de decidir, em voto secreto, sobre a abertura de ação penal contra si mesmos.
Para qualquer cidadão atento, isso não era apenas um truque de bastidores: era a institucionalização da impunidade, a transformação do Congresso em uma verdadeira fortaleza blindada contra a lei e a justiça. O relator da matéria, senador Alessandro Vieira (MDB-SE), não economizou nas palavras: classificou a PEC como “inconstitucional” e “perigosa”, alertando que permitiria que o crime organizado encontrasse espaço livre no parlamento.
A decisão foi unânime. Todos os 27 membros da CCJ acompanharam o parecer, consolidando um raro consenso em Brasília, um cenário em que divergências ideológicas normalmente transformam qualquer votação em batalha campal.
Congresso e Executivo: o circo armado
O presidente da CCJ, senador Otto Alencar (PSD-BA), anunciou que o relatório seria levado ao plenário ainda na quarta-feira, com o compromisso do presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), de rejeitar definitivamente a PEC. O gesto simboliza mais que uma vitória legislativa: é um recado de que, mesmo em meio à politicagem, há limites que não podem ser ultrapassados sem consequências.
Enquanto isso, o Executivo segue ensaiando seu papel de mediador de fachada. Entre discursos públicos e compromissos internacionais, o governo tenta demonstrar que Brasília ainda funciona como o centro da democracia, quando, na prática, muita coisa por aqui se parece mais com um circo: aplausos para as manchetes de jornal e gritos abafados nas ruas, longe do poder real.
O povo nas ruas: a verdadeira força contra a blindagem
A PEC da Blindagem gerou intensos protestos populares. Organizações da sociedade civil apelidaram a medida de “PEC da Bandidagem”, e as manifestações se espalharam por diversas capitais, do Sudeste ao Norte do país. O que ficou claro é que a sociedade brasileira não está disposta a tolerar mais um movimento para proteger políticos de eventuais punições legais.
Segundo levantamento do G1 e do Estadão, mais de 50 mil pessoas participaram de atos em São Paulo, Brasília e Rio de Janeiro. Entre cartazes, buzinas e gritos, a mensagem era única: "Nenhuma blindagem para corruptos!". Mais de 20 senadores se inscreveram para discursar contra a proposta na CCJ, evidenciando que a pressão popular teve efeito direto na postura legislativa.
Jorge Seif e o recuo estratégico
O senador Jorge Seif (PL-SC), que havia apresentado um voto em separado para manter a PEC com algumas alterações, acabou retirando seu relatório alternativo e alinhando-se ao parecer do relator. Um gesto que demonstra que, mesmo entre aliados da PEC, o clima de resistência popular e o medo da opinião pública são fatores capazes de frear medidas audaciosas de blindagem.
Contexto internacional e repercussão
Enquanto isso, o episódio repercute internacionalmente. Publicações como BBC News, Reuters e Al Jazeera destacaram a vitória do Legislativo brasileiro contra tentativas de impunidade e ressaltaram o papel da mobilização popular como força determinante na política nacional. O tema também aparece em relatórios de organizações como Transparency International, que aponta a PEC como retrocesso na governança democrática e na transparência pública.
O legado da votação: um marco histórico
A rejeição da PEC da Blindagem é mais que um ato isolado: é um marco na luta contra a impunidade. Em um país onde políticos frequentemente escapam da lei, o movimento da CCJ mostra que a pressão popular, a vigilância da imprensa e a atuação de parlamentares conscientes podem, sim, frear tentativas de institucionalizar privilégios ilegítimos.
O episódio evidencia também a importância de manter a sociedade mobilizada, de fiscalizar cada passo do Congresso e de mostrar que, no Brasil, a democracia não é uma cortina de fumaça para encobrir interesses privados, mas uma conquista coletiva que deve ser defendida diariamente.
Enquanto o povo protesta, os parlamentares observam e, desta vez, a balança da justiça se inclinou a favor da cidadania, contra o poder de blindagem do próprio Congresso.

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